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Como Contar Prazo Decadencial

Todo advogado aprende na faculdade como contar prazos, não é verdade?

Afinal de contas, o Código de Processo Civil nos dá aquelas velhas e conhecidas regrinhas:

Art. 173. Durante as férias e nos feriados não se praticarão atos processuais. (…)

Parágrafo único. O prazo para a resposta do réu só começará a correr no primeiro dia útil seguinte ao feriado ou às férias.

Art. 175. São feriados, para efeito forense, os domingos e os dias declarados por lei.

Art. 178. O prazo, estabelecido pela lei ou pelo juiz, é contínuo, não se interrompendo nos feriados.

Art. 179. A superveniência de férias suspenderá o curso do prazo; o que Ihe sobejar recomeçará a correr do primeiro dia útil seguinte ao termo das férias.

Art. 184. § 1o Considera-se prorrogado o prazo até o primeiro dia útil se o vencimento cair em feriado ou em dia em que:

I – for determinado o fechamento do fórum;

II – o expediente forense for encerrado antes da hora normal.

§ 2o Os prazos somente começam a correr do primeiro dia útil após a intimação (art. 240 e parágrafo único).

Munidos destas normas, poderemos programar todos os prazos que devem ser observados em juízo, certo?

ERRADO!

O advogado cuidadoso deve lembrar que as normas acima – que são tuteladas no Código de Processo Civil – se destinam aos prazos de natureza processual. Significa dizer: Contestações, réplicas, impugnações e recursos são exemplos típicos ato de natureza processual (e, portanto, sujeitos às regras citadas).

Situação diversa ocorre quando o operador do direito se depara com prazo decadencial. Lembre-se: decadência extingue o próprio direito e é prazo que não se suspende nem se interrompe.

Portanto, prazo decadencial é exemplo típico de prazo de direito material que não se dilata e ao qual não são aplicadas as regras de cômputo de prazo processual. Não é outro o entendimento mais moderno do Supremo Tribunal Federal:

AÇÃO RESCISÓRIA. PRAZO DECADENCIAL DE 02 (DOIS) ANOS. DIREITO MATERIAL. NÃO INCIDÊNCIA DA NORMA QUE PRORROGA O TERMO FINAL DO PRAZO AO PRIMEIRO DIA ÚTIL POSTERIOR. 1. Por se tratar de decadência, o prazo de propositura da ação rescisória estabelecido no art. 495 do CPC não se suspende, não se interrrompe, nem se dilata (RE 114.920, rel. Min. Carlos Madeira, DJ 02.09.1988), mesmo quando o termo final recaia em sábado ou domingo. 2. Prazo de direito material. Não incidência da norma que prorroga o termo final do prazo ao primeiro dia útil posterior, pois referente apenas a prazos de direito processual. 3. Recurso improvido.

Decisão

O Tribunal, por unanimidade e nos termos do voto da Relatora, negou provimento ao recurso de agravo. Ausentes, justificadamente, neste julgamento, os Senhores Ministros Celso de Mello, Marco Aurélio, Carlos Britto, Eros Grau e a Senhora Ministra Cármen Lúcia. Presidiu o julgamento o Senhor Ministro Gilmar Mendes. Plenário, 04.03.2009.

AR 2001 AgR / SP – SÃO PAULO  AG.REG.NA AÇÃO RESCISÓRIA Relator(a):  Min. ELLEN GRACIE Julgamento:  04/03/2009           Órgão Julgador:  Tribunal Pleno Publicação DJe-059 DIVULG 26-03-2009 PUBLIC 27-03-2009 EMENT VOL-02354-01 PP-00181 RDDP n. 76, 2009, p. 147-149

Desse julgamento paradigmático, vale transcrever trechos do voto condutor que, por unanimidade, alterou o entendimento anterior daquela corte:

(….) sendo caso de decadência (Pontes de Miranda, Tratado da Ação Rescisória, 2ª ed., pp. 369-371; José Frederico Marques, Instituições de Direito Processual Civil, vol. IV, Ia ed. atualizada, 2000, p. 418; Sergio Gilberto Porto, Comentários ao CPC, vol. 6, 2000, pp. 392-393; Sálvio de Figueiredo Teixeira, CPC Anotado, 7a ed., p. 353; Luiz Fux, Curso de Direito Processual Civil, 3a ed., pp. 843-844), o prazo de propositura da ação rescisória estabelecido no art. 495 do CPC não se suspende, não se interrompe, nem se dilata (RE 114.920, rei. Min. Carlos Madeira, DJ 02.09.1988), mesmo quando o termo final recaia em sábado ou domingo, como na espécie.

Assim, iniciado em 05.08.2005, o prazo decadencial se esgotou em 05.08.2007 (domingo), ante o disposto no art. 1º da Lei 810/49 (“Considera-se ano o período de doze meses contado do dia do início ao dia e mês correspondentes do ano seguinte”), tendo a ação sido ajuizada, como vimos, apenas em 06.08.2007, portanto, extemporaneamente.

Nesse aspecto, consigno não desconhecer precedente desta Corte, no sentido de que, “se o termo final de prazo recair em dia não útil, prorrogar-se-á até o primeiro dia útil seguinte, mesmo que seja de decadência dito prazo” (RE 86.741-EDv, red. p/ o acórdão Min. Oscar Corrêa, DJ 16.03.1984).

Todavia, tenho entendimento diverso, na mesma linha defendida pelos eminentes Ministros Néri da Silveira, Alfredo Buzaid, Moreira Alves e Djaci Falcão na ocasião do julgamento dos embargos de divergência mencionados, no sentido de que, em se tratando de prazo de direito material, não incide a norma que prorroga o termo final dó prazo ao primeiro dia útil posterior, pois referente apenas a prazos de direito processual.

Vale aqui transcrever, ainda, parte do voto proferido pelo Ministro José Néri da Silveira, no RE 86.741 – EDv, no qual S. Exa. defendeu a tese de que apenas em situações excepcionais -inexistentes no caso em tela, ressalto -, que levem à suspensão do expediente forense, se poderia admitir a dilatação do prazo decadencial para o primeiro dia útil seguinte ao do vencimento:

“(…) Com efeito, se o prazo de decadência terminasse em data que, inobstante previsto o normal funcionamento do Fórum, motivo especial, de força maior, houvesse determinado o ‘ encerramento do expediente forense, antes da hora marcada, ou em seu início, suprimindo-o, nessa hipótese, o embaraço judicial estaria caracterizado como imprevisível, não sendo jurídico prejudicar-se o exercício do direito que ainda lograva oportunidade para dar-se. Não, porém, se se cuida de dia de sábado, domingo ou feriado nacional, pois, aí, o conhecimento de todos, quanto à inexistência de funcionamento do aparelho judiciário, é de fato insuscetível de dúvida (…). “

Portanto, à luz do entendimento hoje vigente no STF, cuidado ao contar prazos para propor ações limitadas pela decadência. Se o prazo é, por exemplo, de 180 dias, inicie o cômputo no dia subsequente ao fato e termine 180 dias depois, ignorando férias, feriados e finais de semana, seja no início, seja no meio, seja no final.

Logo, se por um acaso o último dia do prazo for dia não útil, pare de ficar lendo blog na internet e comece a trabalhar na ação, a fim de protocolizar o feito no último dia útil antes do final do prazo; se isso não for possível, corra para o plantão judicial.

Só não vá confiar no CPC e – obedecendo à risca as suas regras processuais – fazer decair o direito do cliente.

2 comments to Como Contar Prazo Decadencial

  • Cristiane

    Li sua matéria sobre a possibilidade de propositura de RECLAMAÇÃO perante o STJ face a decisões das Turmas Recursais. Seria possível me ceder o modelo. Como é feito? É nos próprios autos ou se forma um instrumento. Desde já obrigada pela atenção.

  • Fernando

    Daniel,

    Levantei esta tese no TSE quanto ao prazo decadêncial das AIME´s e não foi aceita. Este inclusive era o entendimento do nosso TRE, contudo foi alterado com base no entendimento do TSE que prorroga para o primeiro dia útil subsequente.E agora?

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