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Ação Rescisória e Identidade de Partes com o Processo Original

Questão processual interessante foi julgada pela Primeira Turma do STJ, conforme noticia seu site. Segundo entendimento esposado a ação rescisória não exige sempre que todos os autores ou réus da decisão atacada estejam presentes em litisconsorte passivo necessário.

“Não é correto afirmar que, em ação rescisória, o litisconsórcio passivo tem, sempre e invariavelmente, a natureza de litisconsórcio necessário, a impor a participação de todos os que figuraram na primitiva relação processual de que derivou a sentença rescindenda”, explicou o ministro Teori Zavascki, relator do recurso.

Segundo o ministro, no caso de ações que representam mera aglutinação, pelo interesse dos autores, de demandas que podoeriam ter sido propostas separadamente, é possível a rescisão apenas parcial da sentença. É que nessas hipóteses foi formado litisconsorte ativo facultativo comum, e não necessário. A situação é prevista no artigo 46 do CPC.

Concordo com o posicionamento do STJ, visto que não é o simples fato de haver sido formado um litisconsorte no feito, em que foi prolatada a decisão rescindenda que exige essa mesma formação na rescisória. Em verdade, complementando este raciocínio é quão certo afirmar que não é ausência de litisconsorte no feito originário que desonera sua formação na rescisória.

Contudo, acredito que o fundamento da decisão acabou por escorregar um ponto no tecnicismo.

Explico, de fato é indispensável a análise processual da espécie do liticonsórcio anteriormente formado, contudo, menos sob o aspecto da obrigatoridade(facultativo ou necessário), tal qual entendeu a decisão do STJ, e mais no aspecto da cingibilidade da decisão(simples ou unitário).

Apenas para fins didáticos, sem maiores apronfudamentos, quanto a necessariedade o litisconsórcio pode ser formado em hipóteses em que a lei permite ao autor decidir se quer demandar contra mais de um réu ou em conjunto com outro autor(facultativo); ou em hipóteses de formação obrigatória(necessário), sob pena de extinção do feito, por exigência expressa de dispositivo legal ou por unidade de relação jurídica, sendo em qualquer dos casos a legitimidade é do litisconsórcio e não de qualquer dos litisconsortes separadamente.

De outro lado, quanto a cingibilidade, o litisconsórcio pode ser simples, hipótese em que é possível julgamentos diversos para cada litisconsorte, titulares que são de relações jurídcas diversas; ou unitário, quando os litisconsortes são tratados como se uma só parte fossem, sendo julgados da mesma forma, por serem titulares da mesma relação jurídica.

São classificações que partem de premissas diversas e analisados em momentos diversos, visto que a necessariedade é analisada quando da formação do litisconsórcio, enquanto a unicidade é analisada no momento do julgamento do feito.

Feito este breve esclarecimento, cumpre reconhecer que o que vai definir, de fato, se o litisconsórcio, a ser formado na ação rescisória, é necessário ou facultativo não é se assim também o foi na ação em que a decisão a ser reincidida também o era, mas sim se naquela oportunidade foi ou poderia ser formado um litisconsórcio simples ou unitário.

Esta pequena confusão técnica do STJ é causada, em verdade, pela infeliz redação do art.47 do CPC(sanada pelo Anteprojeto no Novo CPC), que trata com promiscuidade o litisconsórcio necessário e o unitário, como se a mesma coisa fossem, o que já fora devidamente demonstrado que não é verdade.

Volvendo-se as explanações já apresentadas, se na primeira ação houve formação de um litisconsórcio unitário, ou seja, onde havia uma única relação jurídica com dois ou mais partícipes, estes todos juntos, em um litisconsórcio necessário( e mais uma vez unitário) devem ser partes na rescisória.

De outro lado, se na primeira ação havia um litisconsórcio simples, onde há cumulação subjetiva e objetiva da lide, ou seja, discutindo duas relações jurídicas diversas, caso a rescisória ataque apenas uma dessas relações, de fato desnecessária a formação do litisconsórcio, visto que a esfera de direito do titular da relação jurídica que anda à margem da rescisória não será em nada afetada.

De se reconhecer que na maioria das vezes, o raciocínio esposado pelo relator estará adequado, pois de fato se o litisconsórcio era facultativo, também seria simples, da mesma forma que o litisconsórcio necessário é na maioria das vezes unitário.

Ocorre há casos em que esta corelação inexiste, podendo haver hipóteses de litisconsórcio facultativo, mas unitário, ou necessário mais simples.

À guisa de exemplo, pensemos na ação de usucapião, onde, por expressa disposição legal, há formação de litisconsorte entre os posseiros e os confinantes ou confrontantes, sendo, portanto, obrigatório, mas com tratamento individualizado a cada um dos réus, posto que simples.

Neste caso, caso o autor perca ação e, posteriormente, busque a rescisão da decisão, pode ingressar apenas contar o proprietário, quando não houve formação de litigiosidade com os confinantes.

Em outra situação, pensemos na hipótese de um dos cônjuges ingressar com uma ação declaratória de validade do casamento, sendo o feito julgado procedente. Aqui, trata-se de litisconsorte unitário, visto que a relação jurídica casamento é incindível, mas facultativo, porque não existe litisconsórcio ativo necessário.

Ocorre que caso o MP tente rescindir essa decisão, embora o autor haja sido apenas o cônjuge varão, na rescisória será necessária a formação do litisconsórcio entre ambos os cônjuges já que é caso de unitariedade da relação jurídica.

Em síntese, embora com o mesmo fim, o fundamento é diverso, de fato não é a existência ou falta de litisconsórcio, no primeiro feito, que exige a repetição da rescisória, devendo, contudo, a análise ser feita sob o viés da unicidade e não da necessariedade.

1 comment to Ação Rescisória e Identidade de Partes com o Processo Original

  • Eddington Rocha

    Bem interessante o artigo e sigo-o na totalidade. Só achei estranho esta confusão ou posicionamento peculiar partir desse Ministro, um reconhecido processualista.

    De qualquer forma, parabéns pelo post.

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