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O CPC contra a morosidade do Judiciário

Assunto sempre atual é a morosidade do judiciário. Informar a um cliente que a decisão pretendida será proferida em pelo menos dois anos é vergonhoso, especialmente quando temos que apontar que isso seria “com sorte”.

Consegui formular uma tese acerca do assunto, envolvendo vários aspectos relativos à Administração Pública, ao Poder Judiciário em si, entre outros. Na formulação dessa tese os aspectos mais importantes foram a minha breve experiência do lado de dentro do balcão e a simples observação do dia a dia do Judiciário.

É justamente esse ponto que gostaria de debater com vocês, após um logo período de afastamento do bLex (sem qualquer motivo específico, diga-se).

Pois bem, passemos à explicação do título desse post.

O Código de Processo Civil não é a mais atual das Leis em vigor, tanto é que as discussões para o novo código já vão avançadas. É imprescindível deixar de apontar, entretanto, que esse CPC tem mecanismos que, se utilizados, dariam muito mais celeridade ao Judiciário.

Tenho certeza que todo advogado atuante já sustentou ao menos um pedido de indeferimento da Petição Inicial combatida. Os artigos 284 (especialmente o parágrafo único) e 295 do CPC são capazes de pôr fim à uma demanda quase q imediatamente – esse imediatamente em termos estritamente processuais.

Dispõem os artigos mencionados que:

Art. 284. Verificando o juiz que a petição inicial não preenche os requisitos exigidos nos arts. 282 e 283, ou que apresenta defeitos e irregularidades capazes de dificultar o julgamento de mérito, determinará que o autor a emende, ou a compete, no prazo de 10 (dez) dias.

Parágrafo único. Se o autor não cumprir a diligência, o juiz indeferirá a petição inicial.

Art. 295. A petição inicial será indeferida:

I – quando for inepta;

II – quando a parte for manifestamente ilegítima;

III – quando o autor carecer de interesse processual;

IV – quando o juiz verificar, desde logo, a decadência ou a prescrição;

V – quando o tipo de procedimento, escolhido pelo autor, não corresponder à natureza da causa, ou ao valor da ação; caso em que só não será indeferida se puder adaptar-se ao tipo de procedimento legal;

VI – quando não atendidas as prescrições dos arts. 39, parágrafo único, primeira parte e 284.

Parágrafo único. Considera-se inepta a petição inicial quando:

I – lhe faltar pedido ou causa de pedir;

II – da narração dos fatos não decorrer logicamente a conclusão;

III – o pedido for juridicamente impossível;

IV – contiver pedidos incompatíveis entre si.

Percebe-se que o CPC oferece uma ampla oportunidade para a rejeição da demanda quando proposta de forma imprópria, no entanto, penso que o indeferimento da petição inicial ou a extinção do feito ocorrem muito raramente.

O despacho saneador é invariavelmente exarado, independentemente da inépcia da petição inicial ou de outras impropriedades processuais. Via de regra o juiz deixa para analisar a conformidade da exordial quando da sentença, passados três, quatro anos de trâmite processual.

Embora a responsabilidade pela demanda seja do advogado, o penalizado é a parte, ou melhor, ambas, uma vez que o autor verdadeiramente perdeu anos numa ação fadada ao insucesso e o réu, que também teve despesas e desgastes, e os terá novamente, muito provavelmente.

Sempre que redijo uma contestação e identifico um dos elementos listados nos artigos acima colacionados, penso no quanto a Justiça poderia ter poupado, em todos os aspectos, se quando da recepção da exordial e do despacho saneador o magistrado tivesse analisado a peça. Seria melhor para quem apresentou a petição inepta, para quem se defende, para o juiz, seu assessor, para os funcionários do cartório e, afinal, para a instituição Tribunal de Justiça como um todo.

Essa é, na minha humilde opinião uma boa forma de o Poder Judiciário Cortar custos e, principalmente, tempo no trâmite das demandas judiciais: analisar a petição inicial, “julgá-la” como apta ou não, nada mais fazendo além de cumprir o que determina a Lei processual.

6 comments to O CPC contra a morosidade do Judiciário

  • Eddington Rocha

    Concordo com suas palavras. Se for para proferir sentença terminativa (como DEVE ser feito nas hipóteses cabíveis), é preciso, até mesmo lógico, que o magistrado analise os requisitos da petição inicial logo ao recebê-la para evitar o que você narrou

    Contudo, também vejo uma outra situação “peculiar”. Muitos juízes, ainda que diante de petições iniciais que precisariam melhorar muito para serem consideradas ruins, simplesmente não analisam os requisitos mínimos necessários para esta peça processual de tamanha importância para a demanda.

    Não sei se por não quererem ver todo o (curto e necessário) desdobramento que advém da determinação de emenda e possível extinção sem julgamento de mérito (o que provavelmente ensejará uma outra demanda preventa) ou apenas para cumprir metas, mas é grande o percentual de vezes que já ouvi o famoso “irei apreciar as preliminares em sentença”. E segue a instrução.

    Ora, como é cabível que sejam proferidas decisões interlocutórias, atos instrutórios, citações, saneamento etc. sem que ao menos se saiba se a petição INICIAL, peça delimitadora de todo o debate a ser travado, é, ou não, apta a ser julgada? Como imaginar efeitos vivos de um processo que eventualmente pode ser declarado natimorto?

    De fato, um novo CPC só será mais um amontoado de palavras. O que combaterá a morosidade será o que se fará dele e com ele.

  • Marcelo Augusto

    E o que dizer das descabidas designações de audiências preliminares (art. 331) quando os casos comportam julgamento antecipado da lide? Em suma: o processo poderia ser muito mais rápido se o CPC fosse aplicado à risca.

  • Rafael Bertazzo

    Pior foi ouvir o seguinte relato de um magistrado que decide apenas as questões processuais depois da contestação (Rejeitando-as):

    “Dr. como vou acolher a preliminar de inépcia, sob o argumento que prejudica a defesa do réu se o senhor apresentou contestação e defendeu o mérito” (Parece que nem existe princípio da eventualidade e ônus de impugnação específica).

    O magistrado mal sabe que, às vezes, os advogados da parte ré “tiram leite de pedra” para entender uma Inicial mal elaborada, mal redigida e se fosse levar à risca, inepta e pronta para ser indeferida.

    Acredito que essa alegação do magistrado não seria necessária se os juízes indeferissem liminarmente a Inicial.

  • Ricardo Tavares de Albuquerque

    Em verdade, ainda não vi magistrado que faz um verdadeiro juízo de admissibilidade das petições iniciais.

  • Rafael Bertazzo

    Ricardo,

    Apenas uma vez eu vi um indeferimento liminar de Inicial por manifesta falta de interesse de agir, nos termos dos artigos citados pelo Luis Felipe (redator do artigo).

  • Indeferimento liminar ou ordem para emendar a Inicial é realmente raro, agora quantas vezes vocês viram uma ação ser extinta por inépcia da Inicial ou por falta das condições da ação? Várias!

    Não custa muito e seria melhor para o próprio magistrado, mas não acontece.

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