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Vai-E-Vem da Certidão de Quitação Eleitoral nas Contas Reprovadas

A correlação entre a aprovação das contas eleitorais e a obtenção da certidão de quitação eleitoral é um tema que está confortavelmente assentando na ponta de uma gangorra. Por conta de um visível cabo-de-guerra entre o Legislador e o Poder Regulamentar do Judiciário Eleitoral, os candidatos que tiveram suas contas de campanha reprovadas em 2008 estão em absoluta dúvida sobre a possibilidade de participarem do pleito deste ano. E se em nível nacional o Judiciário não se decide, em alguns estados – tal como o Amazonas – o problema se potencializa.

Acompanhe a evolução recente do tema.

1. Pré 2008. Antes de 2008, a reprovação de contas eleitorais não tinha absolutamente qualquer efeito na quitação eleitoral. Aliás, a reprovação das contas gerava apenas encaminhamento dos autos ao Ministério Público para tomar eventuais medidas na hipótese de constatar abuso de poder econômico.

2. 2008. Em 2008 o TSE editou uma resolução (a Resolução 22.715) cujo §3º do art. 42 criou a regra de que “a decisão que desaprovar as contas de candidato implicará o impedimento de obter a certidão de quitação eleitoral durante o curso do mandato ao qual concorreu.” Para se ter uma ideia da desproporção dessa regra, se alguém fosse cassado por ter cometidos múltiplos atos explícitos e dolosos de abuso de poder político, abuso de poder econômico e abuso dos mais de comunicação ficaria inelegível por 3 anos e portanto ficaria impossibilitado de concorrer a uma eleição. Se, no entanto, por um erro contábil ou por ignorância da lei eleitoral cometesse um erro na prestação de contas, ficaria 4 anos sem conseguir certidão de quitação eleitoral, o que o impossibilitaria de concorrer a dois pleito. Isso se não fosse candidato ao senado, caso em que estaria fora da vida política por quatro eleições.

3. 2009. O legislativo, entendendo que o TSE tava fora de esquadro, editou a Lei 12.034/09, chamada de minireforma eleitoral, e deu um aparente CTRL-Z na ideia do TSE. Disse a referida Lei que “A certidão de quitação eleitoral abrangerá exclusivamente a plenitude do gozo dos direitos políticos, o regular exercício do voto, o atendimento a convocações da Justiça Eleitoral para auxiliar os trabalhos relativos ao pleito, a inexistência de multas aplicadas, em caráter definitivo, pela Justiça Eleitoral e não remitidas, e a apresentação de contas de campanha eleitoral”. Todos os que leram a lei respiraram aliviados pois o desastre criado pelo TSE estava aparentemente resolvido. Que o diga o Prof. Marco Aurélio Choy que brindou esse blog com um artigo que defendia essa interpretação do novo texto legal.

4. Julho/2010. Os candidatos que tinham suas contas reprovadas se lançaram ao pleito de 2010. Pediram registro das respectivas candidaturas, certos que não teriam maiores problemas. Então, pelo menos aqui no Amazonas, esbarraram no Ministério Público Eleitoral, que impugnou todas as candidaturas de quem teve as contas desaprovadas em 2008. O Ministério Público alegou que a Lei 12.034 não tem o condão de retroagir e portanto quem teve contas desaprovadas em 2008 estaria impossibilitado de conseguir a certidão de quitação e consequentemente não reunia condições de elegibilidade. Candidatos em polvorosa.

5. 02 de Agosto de 2010. O TRE/AM, em acertadíssimo precedente de lavra da sempre brilhante pena do MM. Juiz Federal Márcio Luiz Coelho de Freitas, já publicada no post anterior, afasta a alegação do Ministério Público. Candidatos respiram aliviados de novo. (Para que não me chamem de puxa-saco deixo o registro: os votos de Sua Excelência o Juiz Federal Márcio Luiz são sempre muito bem construídos, mesmo quando redondamente equivocados quanto à matéria de fundo.)

6. 03 de Agosto de 2010. O TSE, em sessão plenária, responde a consulta eleitoral e valendo-se interpretação questionável, afirma que a lei nova precisa ser interpretada de modo a se compatibilizar com a posição dantes regulamentada pela Justiça Eleitoral. Assim, em julgamento administrativo, com placar de 4×3 com um ministro suplente participando do julgamento, o TSE disse que o legislador falou menos do que queria pois o que ele quis dizer mesmo era aquilo que o TSE disse no passado. Compreenderam? O que o TSE fez foi, de fato, ignorar a interpretação histórica da norma. O Legislador editou a mini-reforma como resposta à posição do TSE em 2008. Mas o TSE, se achando como a única fonte do Direito Eleitoral, solenemente ignorou a vontade legislativa para fazer valer a sua vontade quanto à legislative policy no âmbito eleitoral. Candidatos apavorados de novo.

7. 04 de Agosto de 2010. O TRE/AM, mesmo ciente da posição do TSE no processo administrativo, preferiu dar maior valor ao precedente judicial do próprio TRE do que a decisão em consulta (e portanto, em processo administrativo) no TSE. Com divergência do Juiz Federal que lavrou o voto originário – que ressalva a sua posição pessoal, mas segue o precedente do TSE – o TRE, por maioria, está deferindo candidaturas de quem teve as contas de 2008 rejeitadas.

Vamos acompanhar os próximos capítulos dessa novela.

1 comment to Vai-E-Vem da Certidão de Quitação Eleitoral nas Contas Reprovadas

  • BRENO MENDES

    Caro colega,

    gostei muito do artigo, favor pesquisar o RESP 161394 de 06 de setembro ( Rel. Arnaldo Versiani), para incluir no artigo vai e vem, abraço.

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