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Audiência Pública do Novo CPC em Manaus

A Comissão de Juristas criada pelo Senado Federal para redigir o Anteprojeto do Código de Processo Civil realizou na sexta-feira passada uma audiência pública sobre o tema em Manaus.

Não estavam presentes nem o presidente (ministro Luiz Fux) nem a relatora (Teresa Arruda Alvim Wambier). Fazia as vezes de presidente em exercício o advogado Marcus Vinicius Furtado Coelho e como relator ad hoc o Professor Doutor Benedito Cerezzo Pereira Filho.

A audiência se mostrou um fórum para exposição de ideias interessantes e algumas outras nem tanto.

O maior alvo do dia foi, de fato, o conjunto de prerrogativas processuais da Fazenda Pública, tanto no que diz respeito aos prazos, quanto naquilo que concerne ao adimplemento de obrigações por precatório. Diversas pessoas que fizeram uso da palavra para clamar pela equiparação processual da Fazenda aos litigantes comuns, com uma só voz em sua defesa (de uma procuradora da Fazenda nacional).

Além disso, dentre as sugestões feitas, as seguintes merecem destaque (embora nem todas sejam destaque positivo):

* Tornar a execução de dívida não oposta uma atividade extrajudicial ao encargo do poder executivo, sob a tese de que o judiciário existe para dirimir conflitos e “cobrança sem resistência do devedor não é lide”. Preservar-se-ia a hipótese de recorrer ao judiciário apenas nas hipóteses de se questionar o débito. (Sugestão do Desmbargador roraimense Lupercínio Nogueira).

* Incluir honorários em exceções de pré-executividade; (Sugestão do advogado Jean Cleuter)

* Permitir extinção do feito por ausência de impulso das partes mediante intimação dos advogados (Sugestão do juiz Divaldo Martins, que também expôs enorme preocupação com o que será feito com os prazos impróprios);

* Criar um cadastro de intervenientes processuais habituais em cartório, com endereço preestabelecido para correspondência, permitindo, ainda, o depósito de instrumento procuratório (Sugestão do Procurador Regional Eleitoral, Edmilson Barreiros);

* Estabelecer como requisito formal da procuração ad judicia a especificação do endereço onde a parte pode receber notificações, sendo válida qualquer comunicação enviada ao referido endereço, sendo ônus da parte comunicar qualquer alteração (ainda do Procurador Regional Eleitoral)

* Regulamentar de uma vez por todas o processo eletrônico, vez que 40% do tempo do processo se perde em questões cartoriais (idem)

* Positivar o contraditório dinâmico (ou seja, permitir contraditório mesmo para as questões que o juiz pode decidir de ofício) (Dr. Ariosto, defensor público).

* Criar mecanismos para que respeitem os prazos impróprios. (idem)

* Positivar regra que faça incluir em mandados de citação a recomendação expressa de consultar advogado, incluindo ainda telefone e endereço da defensoria (ibidem)

* Aumentar a eficácia da sentença, que hoje é menor do que decisão antecipatória (Juiz Cássio Borges, que reservou tratamento ríspido à “abissal vantagem” da Fazenda Pública)

* Para fim de efetivar a razoável duração do processo, dar ao juiz o poder-dever de proporcionalizar ou até tornar completamente inexigível as custas processuais de feitos que tramitem em prazo superior ao estipulado em lei

* Autorizar ao Magistrado, nas hipóteses de bens não serem encontrados, a arquivar o processo com baixa na distribuição, permitindo seu desarquivamento se o credor encontrar bens (Juiz Elci Simões)

* Acabar com a audiência conciliatória como primeiro ato do processo (Prof. Marcelo, pelas razões já expostas em seu blog).

* Positivar a suspeição por prejulgamento do feito, para hipóteses em que o julgador afirma em qual quantia irá condenar. (idem).

* Assegurar o direito do oficial de justiça de lavrar a penhora (e, digo eu, receber cu$tas) mesmo quando o bloqueio for realizado pelo juiz no sistema Bacen-Jud (não surpreendentemente, de um oficial de justiça)

* Exigir que todos os atos, ainda que comunicados por correios, também precisem ser comunicados por oficial de justiça (sugestão de outro meirinho).

Também estive lá, e tinha uma pequena lista de sugestões para fazer:

i) Acabar com as assistemias provocadas pelas reformas do CPC, tais como:

a.) No agravo de instrumento (que passará a lidar com tutelas de urgência) permitir sustentação oral (que não era permitida, pois na redação atual do atual CPC, só matérias menores era agraváveis)

b.) Definir em que momento se executam as astreintes (ou multas comunatórias) que não estavam previstas no CPC original e para as quais não há clara definição de quando passam a ser exequíveis;

c.) Nos embargos de declaração, havendo pedido de efeito infringente, autorizar contraditório, realizar publicação de pauta e permitir sustentação oral;

d.) Positivar a exceção de pré-executividade fiscal

ii) Incluir uma versão modificada do período de graça do direito argentino, como mecanismo de aproximar o direito processual do material;

iii) Criar um mecanismo misto que tanto asseguraria a eficácia imediata da sentença quando o duplo grau de jurisdição, ao mesmo tempo que impediria a profusão de instrumentos para atribuição de efeito suspensivo.

Infelizmente, mesmo tendo recebido extensão de tempo do presidente da mesa, não consegui formular todas as propostas, mas em conversa posterior, fiquei de encaminhá-las por email. Algumas das sugestões que pretendia fazer já foram objeto de post aqui no bLex; para as demais, espero preparar um post explicando-as ainda essa semana.

No todo, tive uma impressão que espero estar equivocada. Apesar do esforço e do trabalho bem realizado pelo Marcus Vinicus e pelo do Cerezzo, tive a pequena impressão de que a audiência pública do Norte existiu apenas para cumprir o protocolo. A impressão que ficou é que iam fazer no resto do país e ia ficar feio se não viessem a pelo menos uma cidade do Norte.

Honestamente espero estar equivocado.

Enquanto ocorria essa audiência pública – que é anterior ao texto do anteprojeto e portanto ainda em nível conceitual – o relator e o presidente estavam ocupados redigindo o texto que pretendiam entregar ao Senado.

Assim, pergunto: qual o real peso que pode ter um novo viés conceitual se o anteprojeto já está em fase de redação? Se a reencarnação de J.J. Calmon de Passos aparecesse na sexta-feira com um conceito fabuloso e absolutamente revolucionário, a comissão teria condições práticas de incluir essas sugestões?

Fiquei com a impressão de que essas últimas audiências estão ocorrendo exatamente no pior momento possível. Fossem mais cedo, poderiam servir de verdadeira fonte para os conceitos que serão utilizados na redação do anteprojeto; fossem mais tarde (depois de pronto o texto do anteprojeto), admitiriam propostas concretas a partir de um texto concreto. No momento que aconteceu a audiência de Manaus, temo que não tenha sido possível nem uma coisa nem outra.

Mas, mais uma vez, repito: Honestamente espero estar equivocado.

6 comments to Audiência Pública do Novo CPC em Manaus

  • Apenas para complementar as tuas informações, eu também sugeri a previsão expressa de suspeição do juiz quando o mesmo for amigo íntimo do advogado de uma das partes (atualmente a suspeição existe quando houver amizade íntima entre o juiz e uma das partes).

    Sobre a audiência, entendo que a sua finalidade precípua foi prejudicada pelas demoradas manifestações de quem não deveria falar muito (integrantes da mesa).

    Você, eu e todos os que queriam falar foram prejudicados.

  • Favor trocar o “foram” por “fomos”.

  • Douglas

    Nobre colega Marcelo, muito bem! esta amizade entre advogado e juiz, muito prejudica os desconhecidos advogados! infelizmente em nosso Estado sofremos muito com esse tipo de privilégio. Não conheço Vossa Excelência, mas o Prof. Daniel Nogueira, pra mim, foi um sinal que ainda poderiamos sobreviver usando técnica e conhecimento jurídico.
    Sobre audiência do CPC, sabemos que não somos considerados pelos de fora, grandes pensadores jurídicos, talvez esse foi um dos motivos que de certa forma ignoraram nossa região, já tive a oportunidae de advogar em outro Estado, e a fama de nosso judiciário é das piores, e fica pior com as notícias de que nossos julgadores são suspensos, afatados ou aposentados por atos incompatíveis com a justiça. É muito triste a fama que o judiciário amazonense possui lá fora.
    Forte Abraço.

  • Obrigado pelo apoio. Espero que a minha sugestão seja considerada pela Comissão de Reforma.

  • Daniel:

    Li ontem, no site do STJ, informação no sentido de que o novo CPC permitirá sustentação oral nos agravos de instrumento nos casos de tutela de urgência.

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