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Da Necessidade de uma Reforma de Paradigma para a Efetividade do Novo Código de Processo Civil: Providências Preliminares.

Um dos temas mais discutidos no meio jurídico nos últimos tempos tem sido o novo Código de Processo Civil, tema de fato palpitante e de suma importância para efetiva prestação jurisdicional.

O bLex não tem se furtado de enfrentar tal questão, ao revés, inúmeros posts já foram publicados a este respeito, havendo sido analisando o paradigma conceitual do novo código, apresentadas propostas e ponderações quanto às principais alterações.

Inegável a importância deste tipo de discussão, como instrumento de compreensão e solidificação dos novos institutos e da nova faceta de institutos já conhecidos. O direito é dialético por essência e quanto mais se discute, mas próximo se chega da razoabilidade.

Contudo, as referidas alterações e inovações tenderão à cabal ineficácia, caso mantenham-se no campo abstrato da norma, sem a concretização no dia a dia das demandas processuais. Daí a necessidade de que seja da mesma forma discutida a atuação jurisdicional do poder judiciário, como materializador de toda a visão moderna que o legislador tenta ofertar ao processo, adequando-o a matizes de ordem constitucional.

Discurso vazio será o da busca da racionalização e da efetividade da prestação jurisdicional, propagadas como norte dos elaboradores do novo código, se neste mesmo viés não se enveredar a ponta desta cadeia de solução dos conflitos, a saber, o judiciário.

Entendo que a busca de uma ordem jurídica justa, de uma prestação jurisdicional racional e efetiva, aplicando a norma abstrata ao caso concreto, na busca da pacificação do conflito ou ao menos o tornando juridicamente irrelevante, há de ser verdadeiro mantra a ser entoado diuturnamente pelo Poder Judiciário.

Esta preocupação surge de uma simples constatação de minha labuta advocatícia diária, visto que o Código de Processo Civil atual, sobretudo depois das inúmeras microreformas sofridas, já demonstrava este mesmo objetivo, sendo que inúmeros instrumentos capazes de alcançá-lo são simplesmente ignorados nos feitos judiciais.

Os exemplos de tal constatação se proliferam, sendo que neste post foco minha visão apenas no desprezo que a maioria dos juízes(ao menos em Manaus) ofertam as providências preliminares nos processos de conhecimento do rito ordinário. De pouca importância a modernidade das normas processuais se não houver uma mudança de comportamento dos magistrados.

Trata-se de prática corriqueira que o magistrado paute Audiência Preliminar sem ao menos haver analisado os autos, para prestar uma jurisdição efetiva, através da análise a respeito do cabimento, necessidade ou aptidão procedimental para a realização da referida audiência. Deparo-me diuturnamente com audiências preliminares em que há pedido de formação de litisconsórcio, denunciação à lide ou outra espécie de intervenção de terceiro pendentes, o que apenas é constatado em Audiências que aguardaram 3, 4, 6 meses para serem realizadas.

Não bastando isso, dificilmente a audiência é utilizada para todos os fins previstos no CPC, servindo na maioria esmagadora das vezes como mera tentativa de conciliação, dando-se prazos às partes para realização de atos que, ou já deveriam haver sido realizados ou o eram na referida audiência. Some-se a isso ainda a costumeira conclusão para análise de questões pendentes que também ou já deveriam haver sido enfrentadas ou deveriam haver sido na aludida audiência.

Em verdade, a prática é verdadeiro manual do que não deveria ser feito, menos porque a letra da lei indica de forma diversa e mais porque isso faz com que os feitos tornem-se ainda mais e desnecessariamente morosos.

Tenho certeza que caso os juízes seguissem um roteiro simples de análise das questões preliminares, muitos feitos teriam sua fase de cognição bastante diminuída, sendo resolvidas em menos da metade do tempo.

O PRIMEIRO PASSO seria a análise prévia da peça contestatória para, ao invés de determinar a intimação do autor sempre para se manifestar a seu respeito, constatar-se se houve a alegação de alguma das preliminares do artigo 301 ou a alegação de fato desconstitutivo, modificativo ou extintivo do direito do autor.

Apenas nestas duas hipóteses mostra-se necessária a manifestação do autor. Digamos, por exemplo, que o réu ateve-se a realizar uma defesa direta de mérito, negando a existência dos fatos que constituem o direito do autor; ou reconhecendo os fatos alegados ataca as conseqüências jurídicas apontadas pelo autor, completamente desnecessária sua intimação para manifestação.

Se fosse necessária a intimação do autor, o magistrado, depois de ouvi-lo, deveria, como SEGUNDO PASSO, verificar a existência de uma das seguintes hipóteses:

Há questão preliminar suscita cujo enfrentamento foi oportunizado ao autor? Se a resposta for positiva, em que pese a possibilidade de que haja o enfrentamento na audiência preliminar, conforme textualmente prevê o art. 331, creio que este é o momento mais oportuno para seu enfrentamento, evitando-se a possibilidade de realização de uma série de atos processuais inúteis. Se a preliminar for acatada, ou se oportuniza ao autor que sane o vício ou o feito deve ser extinto sem resolução de mérito.

Se a preliminar for indeferida, passa-se a questão seguinte.

A questão debatida permite o julgamento conforme o estado do processo? Se a discussão travada entre autor e réu se der no campo estritamente jurídico e não fático, ou seja, divergindo quanto as conseqüências jurídicas de determinado fato incontroverso, desnecessário o prolongamento do feito, podendo o mesmo ser julgado desde logo pelo magistrado.

Da mesma forma, se houver algumas das hipóteses do art. 269, incisos II, III, IV e V situação que reclama a imediata extinção do feito com resolução de mérito. Lembrando-se que as hipóteses de prescrição ou decadência, em que pese poderem ser conhecidas de ofício pelo magistrado, não dispensam que seja oportunizado ao autor convencer o juiz de que não há materialização de suas hipóteses, quando a questão não haja sido anteriormente debatida. Caso a resposta a questão seja negativa, passa-se a questão seguinte.

Os direitos discutidos em juízo permitem a transação? Se a resposta for positiva, pauta-se audiência preliminar. Caso a resposta seja negativa, inicia-se a fase instrutória .

Destaco mais uma vez, que em que pese a possibilidade de que questões processuais pendentes possam ser analisadas na audiência preliminar, entendo que tal hipótese há de ser a exceção, visto que a análise que preceda tal ato é sempre mais útil ao processo, evitando-se que depois de aguardar longo tempo para que a mesma possa ser realizada, constate-se a falta de um litisconsorte ou de um terceiro cuja intervenção foi requerida etc.

Creio que, antes de ser pautada a audiência preliminar, as questões processuais pendentes deveriam ser analisadas pelo juízo, como medida de efetiva racionalização da prestação jurisdicional.

Sendo hipótese, portanto, de audiência preliminar, materializa-se o TERCEIRO PASSO, devendo ser previamente buscada a conciliação das partes, o que permitiria o julgamento do feito com resolução do mérito, através da homologação do acordo.

Infelizmente, o judiciário amazonense costuma dar à referida audiência apenas esta função, concedendo prazos às partes e levando os autos conclusos, sendo certo que se os passos anteriores houverem sido seguidos tal postura não será cabível.

Assim sendo, frustrado o acordo o magistrado fixa os pontos controvertidos, especificando os fatos a respeito dos quais será necessária a produção de provas. Aqui surge outra questão interessante, a praxe forense tornou regra que as partes podem fazer solicitações genéricas de provas, especificando-as quando da audiência preliminar, o que a meu ver é um equívoco, menos pela letra da lei e mais pelo desnecessário retardo que tal entendimento acarreta ao feito.

Creio que o artigo 282 e 300 do CPC deixem, suficientemente, claro o momento processual oportuno para que autor e réu requeiram as provas. Por seu turno, a determinação do art. 331 não é de requerimento de provas pelas partes, mas sim do enfrentamento de tais requerimentos pelo magistrado, pois seria na audiência preliminar que o magistrado poderia fazer uma análise mais adequada a respeito da pertinência das provas requeridas pelas partes, bem como para que ele próprio determine as provas outras que entenda necessárias.

De se destacar que as provas mencionadas aqui não podem ser documentais, ao menos em regra, visto que estas provas já devem constar dos autos neste momento, trazidas pelo autor em sua exordial e pelo réu em sua contestação, salvo tratar-se de provas referentes a fatos novos.

Os três passos aqui propostos não trazem nada de novo, tão somente indicam o fiel cumprimento das regras do CPC atual, não por fetichismo processual, mas em nome da efetividade, que passa necessariamente por uma celeridade, da prestação jurisdicional.

Em face do exposto, reforço, de nada adiantará normas novas e modernas, se a cabeça daqueles que devem impor seu cumprimento caminhar no sentido que hoje caminha, a mudança há de ser verdadeiramente geral.

Por fim, de se destacar a importante função do advogado neste cenário, pois é este quem deve exigir do magistrado o respeito ao que aqui foi defendido, o que certamente não tem ocorrido, ora por despreparo técnico, ora por uma absurda subserviência aos magistrados.

14 comments to Da Necessidade de uma Reforma de Paradigma para a Efetividade do Novo Código de Processo Civil: Providências Preliminares.

  • Rookie

    Pertinente a sua colocação, mas tal rapidêz ao decidir, inibiria ou atropelaria uma das partes, tendo em vista inúmeros fatores, tais como a amizade entre juiz e advogado, caução fraudulenta cobrindo liminares, plantões suspeitos esperados pelo advogado, vicios esses que só seriam percebidos/descobertos mais tarde e que, certamente prejudiciais, comprometeriam a lide.
    Em sendo assim, por enquanto, o melhor, conhecendo a nossa terra, famosa por ter até boi voando, é aguardar pelo trâmite normal, embora lento, das nossas buscas. Em tempos 0nline, é vizivel o seu desejo de dinamizar as demoradas atuações, no entanto, a posição diante das demonstradas possibilidades em contrário, é de cautela.

  • Ney Bastos

    Caro,

    Todos nos sabemos das peculiares de nosso judiciario local, mas não consegui entender qual a relacão com as propostas do post, pois o risco dos conluios indicados existe em um processo rapido ou moroso, tanto que os processos hj em tramite, que seguem o caminho aqui criticado, vivenciam todas as vicitudes por voce narrada.

    Ademais, não proponho celeridade estranha as previsões ja postas,qq atropelo a direitos, tão pouco mencionei qualquer questão referente a plantão.Proponho apenas que as regras processuais ja existentes sejam respeitadas.

    Concordo com suas ponderacões, mas, sinceramente, não vejo nelas qualquer nexo com o conteudo do post.

    Obs: Favor desconsiderar a configuracão do teclado.

  • Rookie

    Sempre procuro lembrar quanto à essas “exceções“ porque em verdade, temo por esses procedimentos que, na correria, podem passar batidos. Na realidade, procuro estar sempre batendo na mesma tecla para evitar que, novamente, isso possa vir a acontecer. Como o seu tema se trata de dinamizar, ou mesmo economia de tempo, a vinculaçào com o assunto, mesmo que de forma velada ou indireta, no meu entendimento reforça o meu ponto de vista quanto a prevenção quanto a esses procedimentos, inclusive plantões, mesmo não tendo sido mencionado pelo Sr. Não se preocupe, é apenas uma forma pessoal de abordar um ângulo, por mim, considerado preocupante. Agradeço o espaço e não tenho intenção de montar um blog só para divulgar o que acho ou entendo correto. Em sendo assim, como é um dos temas que me interessa, opino. Apenas isso. Não há ofensa em discordar ou apenas, lembrar. Quanto a configuraçòes, nem se preocupe, o valor de vcs todos não vai ser medido por pequenos erros de digitação, mas pelo conteúdo excelente. Abraços

  • Bruno César

    Prof. Ney! Belo artigo, agora sim um artigo…com fundamento e autoridade de quem entende, e não de curiosos ou filhos abastardos de autoridades que querem pegar o vácuo e emplacarem!
    A Reforma do CPC é questão que urge há tempos em nosso sistema jurídico e a busca pela efetividade é algo que permeia o sentimento de todos nós, não somente operadores do Direito, como também na condição de cidadãos.
    Continue a contribuir com a sociedade jurídica com seus posicionamentos neste Blog.
    Parabéns e parabéns ao Prof. Daniel tbm.
    Grande Abraço

  • Perfeitas as suas colocações. Eu sempre fui contra a designação desnecessária da audiência preliminar. Muitos processos poderiam ser finalizados rapidamente se o magistrado observasse as regras procesuais em vigor.

    Entretanto, mesmo sabendo estar sendo repetitivo, o horizonte não é nada favorável, já que o novo CPC terá como fase obrigatória para todos os procedimentos processuais uma audência preliminar de tentativa de conciliação. Ou seja: adeus celeridade processual.

  • Rookie

    Discordo do prof Marcelo. Uma das minhas primeiras surpresas/decepções com o judiciário foi que, ao argumentar com um juiz conhecido sobre a “perfeição“ de uma peça, a meu ver “incontestável“ e clamando por uma inaudita altera pars, ouvi dele, ao vivo e a cores o seguinte:

    “Prezado, para um juiz decidir com a consciência limpa, somente o contato pessoal, ali, tete a tete numa audiência, é que, sentindo as duas partes, as decisões fluem com transparência. No papel vem de tudo inclusive verdades e meias verdades, mas ali, diante do meu questionamento e a forma com que recebo as respostas, é que eu decido.“

    A partir de então, eu, aprendiz, passei a respeitar e dar valor as audiências.

  • Ney Bastos

    Caros Rookie e Marcelo,

    Acho qué é possível separar casos e casos.

    Em determinadas situações, como as narradas pelo Rookie, é possível de fato que a “verdade” trazida aos autos por uma das partes seja totalmente desmascara em uma audiência, o que faz com que seja indicada, sempre que o juiz entenda necessário, a determinação de uma audiência de justificação prévia, em casos de liminares como exemplificado no comentário.

    Em várias outras situações, contudo( a maioria diga-se de passagem), a realização da audiência preliminar é apenas mais um entrave à rápida e efetiva solução da lide.

    A meu ver, como defende o Marcelo, o problema está na obrigatoriedade e não na possibilidade de designação de audiências preliminares.

  • Quando o direito é cristalino, comprovado através de prova documental e, principalmente, não refutado pela defesa, com a devida vênia, olhar nos olhos de quem pede, para, só então, poder sentenciar, é permitir que a burocracia procedimental prevaleça sobre a efetividade da prestação jurisdicional.

  • Ney Bastos

    concordo plenamento com vc meu amigo, repito que a mim o problema não está na previsão da aludida audiência, mas sim na presunção quase absoluta, por parte do judiciário, de que sua realização deve ser sempre realizada.

    Criar regra, partindo da exceção, parece-me sempre inapropriado.

  • Ney Bastos

    Concordo plenamento com vc meu amigo, repito que para mim o problema não está na previsão da aludida audiência, mas sim na presunção quase absoluta, por parte do judiciário, de que sua realização deve ser sempre realizada.

    Criar regra, partindo da exceção, parece-me sempre inapropriado.

  • Rookie

    Ok, eu demonstro caso específico que me leva a manter a posição.
    Considerando que podemos estar dos dois lados da lide, numa situação autor, na outra réu, em especial na concessão de liminares, devemos ter cautela onde, sem ouvir a outra parte um juiz possa levar-se a:
    exemplo)- numa execuçao por exemplo, o “autor“ embora não haja audiência em execuções, o autor “comparece“ a um plantão e simplesmente, com uma caução fraudulenta ou inidônea, induz o plantão a conceder liminar para arrestar bens do suposto réu e o juiz concede. Só que a dívida, se trata de um titulo condicionado a um evento futuro. Detalhe:direito cristalino, comprovado atraves de prova documental demonstrado tanto pelo autor quanto pelo réu.
    A cautela, meus caros, se trata apenas para esses casos abomináveis, ao qual eu próprio já fui vitima, daí a prevenção quanto a decisões muito rápidas sem a providente audiência.
    É evidente que a regra geral se aplica a pessoas de bem como vcs todos, mas simplesmente existem esses maus exemplos que nos inibem, tanto a pedir, quanto conceder(juízes).
    Nós pedimos quando autores, todavia eles juizes, na maioria das vezes, não concedem por precaução. Sentindo na pele a força de uma liminar é que me faz manter tal postura. Não é implicância, apenas uma forma de evitar problemas posteriores. E digo mais, para ajustar a hda feita em caso concreto pelo primeiro juiz, dois anos após, já estamos no quinto juiz que julga-se suspeito temendo prejudicar juizes anteriores que nada julgaram, a não ser a primeira liminar que segue viciada e defeituosa até a presente data.
    Obrigado pela exposição.

  • Mas, convenhamos, esse teu exemplo é uma lamentável exceção (pelo menos eu espero que o seja!).

  • Complementando:

    Quando eu mencionei direito cristalino, tive o cuidado de acrescentar que seria baseado em prova documental e não refutado pela defesa. No caso mencionado por você, salvo engano de minha parte, foi concedida liminar inaudita altera pars, o que não se enquadra no que eu mencionei, já que não houve a manifestação do réu.

    Mas, obviamente, respeito e sempre respeitarei o seu ponto de vista.

  • Rookie

    Obrigado pela atenção. Procuro sempre caminhar por estas vias para evitar que a lide se transforme numa salada jurídica recheada com rocambole de goiabada, pastel e cimento, e que após misturada como está a minha, ninguem(juizes) quer se aventurar a fazer os reparos.Detalhe,hoje, tudo acompanhado pelo CNJ.

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