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De Fato, Um Novo Tribunal

Caros leitores, foram postados no bLex alguns posts que analisaram de maneira crítica a atuação do Poder Judiciário em todas as suas esferas, sendo certo que eu pessoalmente talvez tenha essa característica ainda mais aguçada, havendo postado várias situações fáticas e jurídicas que desabonam a postura dos membros de tal Poder.

É certo, contudo, que, como muito bem alertou o Zamith ao comentar o meu primeiro post neste blog, a crítica vira discurso vazio quando aquele que a propaga é incapaz de reconhecer as virtudes a quem elas são dirigidas, tal qual é vislumbrado na ainda frágil política partidária pátria onde a oposição é sempre do contra, não importa se a medida governista é boa ou não (digo isso independentemente do partido que esteja no governo e daquele que é oposição).

Exatamente por este raciocínio, há algum tempo decidi escrever um post destacando o importante momento vivido pelo Tribunal de Justiça do Amazonas, que recebeu uma enorme fonte de ar puro ao passar por natural processo de renovação.

Os afazeres profissionais acabaram por retardar o post e minha ideia inicial acabou por ser apresentada, certamente de maneira bem mais brilhante, pelo douto Desembargador Mauro Bessa, em seu discurso de posse do mais novo desembargador da corte, Desdor. Cláudio Roessing.(como tinha compartilhado com algumas pessoas a ideia deste artigo, estou livre da pecha de plagiador).

Antes, contudo, de destacar os pontos do mencionado discurso com os quais eu concordo plenamente, permitam-me divagar um pouco a respeito do tema.

Sem qualquer sombra de dúvida, nossa democracia é ainda muito tenra, quando se considera que a atual Constituição Federal, que deu gigantesco passo na consolidação das instituições pátrias, iniciou sua vigência apenas em 1989, ou seja, temos tão somente 20 anos de democracia.

Esse tempo seria curto para a perfeita compreensão e aplicação de qualquer norma constitucional, em função de sua força normativa dentro do estado democrático de direito, sendo certo que o fruto da constituinte de 1988 foi ainda mais difícil de amadurecimento, por quebrar uma série de paradigmas da organização constitucional pátria.

Concentrando-se na esfera judicial, que é o objeto deste post, impossível não se reconhecer que da noite para o dia os operadores do direito se viram de frente a um arcabouço jurídico substancialmente diverso do anterior, onde o cidadão passou o centro de toda a organização político-administrativa do país, que existe e se mantém em função daquele, que no ponto peculiar que nos importa é o jurisdicionado.

Dentre outros vários problemas, destaco o fato de que os magistrados da época e, posteriormente, desembargadores haviam sido formados academicamente e profissionalmente, no exercício da magistratura com uma visão arcaica da função que exerciam.

Sem qualquer tipo de ataque pessoal a quem quer que seja ou praticar o injusto julgamento do homem do passado com base nos padrões atuais, o fato é que a renovação vivenciada pelo Tribunal do Estado do Amazonas trouxe aos seus quadros não apenas novos desembargadores, pelo critério temporal, mas novos desembargadores quanto a visão da atuação do judiciário, o que de fato faz com que novos ares sejam respirados.

Sei que o discurso citado gerou certos constrangimentos, porque alguns desembargadores sentiram-se afrontados, uma vez que alguns deles lá já estão a certo tempo e foram citados pelo CNJ, quando de sua inspeção, mas suas palavras em mim reverberaram no exato sentido que aqui me manifesto.

Faço minhas as seguintes palavras do douto Desembargador:

” Em menos de dois anos, o Tribunal de Justiça do Amazonas renovou a sua composição em mais de 40%. Trata-se de um novo Tribunal, sem qualquer relação com aquele inspecionado pelo CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA. São novos tempos.

Hoje não há mais lugar para o tráfico de influência, para a interferência das forças políticas e empresariais, para o corporativismo. A escolha do DR CLAUDIO ROESSING, ao cargo de desembargador pelo critério de merecimento, é a prova viva das mudanças ora em curso.”

Não se pode negar que sempre foram essas as características do Judiciário local, e isso sempre foi normal, é como se fosse a regra do jogo, o plus de ser desembargador, estar acima do bem e do mal.

Os tempos são outros, a constituição erradia seus preceitos a todas as esferas da sociedade, o CNJ exige, cobra e pune os membros do judiciário como de fato há de se proceder com aqueles que não honram a toga que vestem. Impossível não se atestar que os tempos são outros quando se ouve tal discurso, vindo de um membro do Judiciário.

Destaco, contudo, que minha visão parece caminhar no entendimento que tal estágio é fruto tão somente de um amadurecimento normal das instituições brasileiras e, por conseguinte, do Poder Judiciário o que não é verdade. A meu ver, este é um dos dois fatores que, conjugados, levaram ao momento hoje vivenciado em nosso Tribunal.

O fato é que essa renovação se materializou, não somente em desembargadores com uma visão moderna da atuação do judiciário, da relação deste com os demais operadores do direito e com os jurisdicionados, mas também em profissionais de fato preparados tecnicamente.

Digo isso, porque há um sem número de magistrados em primeiro grau, que mesmo que novos na idade e no pensamento, não possuem(em minha humilde visão) um atuação técnica digna de elogios.

Nos últimos tempos, vimos a posse da Desdora. Socorro Guedes, Desdor. Flávio Pascarelli, Mauro Bessa, Paulo Lima e Cláudio Ressing(só para citar aqueles que mais admiro) o que sem dúvida alguma deu uma nova feição ao Tribunal.

Os debates entre os Desembargadores, quando dos julgamentos, que na história recente do tribunal não eram vistos, hoje se tornaram regra, o que deve merecer destaque, mesmo quando saio derrotado, o que certamente continua ocorrendo. Ocorre que ao menos a satisfação de saber que a questão foi discutida, estudada, analisada dá uma efetiva sensação de justiça.

A divergência de pensamento sempre existiu e vai existir, é da natureza dicotômica do direito, mas nem mesmo minhas derrotas jurídicas podem apagar o fato de que me sinto mais seguro, juridicamente falando, com a atual composição do Tribunal.

Destaco que não convivo com qualquer dos desembargadores aqui citados, não são meus amigos, tão pouco frequento suas casas, os conheço tão somente do dia-dia profissional e, certamente, nenhum deles me conhece pelo nome, ou seja, não estou na defesa pessoal de quem quer que seja, apenas me sinto na obrigação de externar tal pensamento, depois de haver tecido tantas críticas.

Espero que o tempo não me faça pensar de maneira diversa.


8 comments to De Fato, Um Novo Tribunal

  • Wadson Benfica

    Sem dúvida todos nós temos que aplaudir, mesmo que com uma das mãos fechadas, a renovação que vem acontendo no Judiciário do Amazonas. Não trata-se somente de trocar pessoas, mas de mudar toda uma postura que ainda vinha da época dos coronéis.
    É com louvor que venho observando o quanto o Judiciário vem ocupando espaço na mídia com muitas atitudes plausíveis de receber apoio de toda a população.
    Na semana passada, numa sala de aula (sou professor) eu fiz questão de salientar aos alunos que essa mudança que vem ocorendo onde grandes traficantes e autoridades começam a ser investigadas é uma das mais significantes formas de para para pensar e refletir que nem tudo está perdido. A mudança que a sociedade tanto espera começa a se materializar e o que parecia impossível já está ao nosso alcance.
    Parabéns a todos àqueles promotores, juízes, desembargadores … que fazem jus ao seu juramento de cuprir a legislação em favor da justiça.

    O caminho é longo, nunca acaba, mas não podemos nunca nos desviar dele.

    um abraço

    Prof. Wadson Benfica

  • Fernando Todeschini

    Obrigado Ney. Agora senti orgulho de ser servidor do Tribunal de Justiça do Amazonas e não vergonha como vinha sentido ultimamente…

  • Daniel Fábio Jacob Nogueira

    Eu sou advogado há mais de uma década e até hoje nunca consegui interpor Embargos Infringentes. (Para quem não lembra, os embargos infringentes so cabem contra decisão não-unânime que reforme uma sentença de mérito)

    Com a nova composição do tribunal, os novos desembargadores mais propensos a divergir, e com os assessores fazendo um trabalho de qualidade (como meu amigo Todeschini), quem sabe eu não consiga realizar o sonho de protocolar os tais Embargos Infringentes na próxima década?

  • Flor do Lácio

    Solicito esclarecimento acerca do texto:

    “Os tempos são outros, a constituição ERRADIA seus preceitos a todas as esferas da sociedade..”

    O que é mesmo que a constituição faz quando ERRADIA seus preceitos?

    Seria ERRADIA o oposto de ERRANOITE?

  • Ricardo Adv

    Vc tem certeza do que escreveu Ney? Será tão novo assim? Tenho dúvidas..

  • Ricardo Adv

    Daniel,
    São as célebres decisões unânimes de um relator só.

  • Daniel Fábio Jacob Nogueira

    Ricardo,
    São muitas as decisões unânimes, é verdade, mas a divergência tem se tornado cada vez mais frequente no TJ/AM. Os pedidos de vista e os votos vencidos – tão importantes na dialética que constrói o direito – devagarzinho estão ganhando espaço nesse novo Tribunal.

  • [...] Em post escrito por mim, há pouco mais de um ano, destaquei que o Tribunal de Justiça do Amazonas, recebeu uma enorme fonte de ar puro ao passar por natural processo de renovação. [...]

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