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Direito & Economia x Direito & O Homem

Os autores do bLex tem enfrentado diversas vezes a mútua influência do direito e da economia. Pessoalmente, iniciei o assunto superficial e incidentalmente enfrentada no post intitulado Avanço ou Retrocesso, e depois, com mais profundidade, abordei o tema como preâmbulo ao debate dos prêmios pagos aos empregados.

Por conta de meus posts (em particular, do último que publiquei) recebi algumas críticas e comentários, especialmente vindos de uma grande e brilhante amiga. Segundo seu argumento, eu deveria considerar uma visão mais antropocêntrica do direito como caminho adequado de criação e interpretação da norma jurídica.

De acordo com o raciocínio por ela proposto, eu deveria considerar uma visão mais humanística e menos econômica, sendo o homem o centro do direito, e a economia um instrumento de realização dos interesses e objetivos humanos. Por mais paradoxal que pareça, é possível concordar plenamente com o que me proposto, sem, contudo, fugir de minhas características e de meu argumento anterior.

De antemão, destaco que meus posts anteriores em hipótese desconsideraram uma visão antropocêntrica do direito, à luz da norma sistemática constitucional pátria imposta pela Constituição Cidadã de 1988; ao revés, destaquei e reforço que a importância da análise econômica do direito está no fato de que o homem é um ser econômico por essência, buscando os bens da vida basicamente nas relações econômicas.

Defendi e continuo defendendo que a importância da visão econômica do direito está no homem, pois a economia se encontra no dia-a-dia de toda cidadão, “tanto em suas finanças domésticas, quanto em suas relações com o mercado, com seus patrões, empregados etc., sendo certo que, no mundo moderno, o movimento da macroeconomia gera enormes conseqüências na vida do “Seu João”.”

Daí se constata que a visão humanística do direito, tendo como teleologia a consecução de uma vida digna ao cidadão, exige uma análise econômica do direito, sob pena de que tal objetivo não seja alcançado. Se passei a falsa idéia de que defendo a economia como fim ou me expressei mal ou fui mal interpretado.

5 comments to Direito & Economia x Direito & O Homem

  • Pedro Henrique

    Rapaz, que viagem! Confesso que minhas interpretações não alcançam esse nível todo mas tá legal. Só uma pergunta? Tu tá defendendo qual dos dois lado e qual a diferença deles?

  • Ney Bastos

    Caro Pedro,

    Na verdade não defendo um ou outro, mas sim que esta visão antagônica é que parte de uma premissa equivocada.

    Acredito(sem deixar de considerar a hipótese de estar completamente equivocado) que o fim de toda norma há de ser de fato o homem, pois a realização de uma vida digna há de ser o escopo de todo ordenamento jurídico.

    Contudo, defendo que na busca deste fim, o legislador e o intérprete da norma não podem ignorar as relações humanas em geral, que são econõmicas por natureza.

    Em suma, não se pode defender o homem à revelia da economia, nem ignorá-lo na análise das regras econômicas, pois estes possuem entre si verdadeira relação de causa e efeito.

    Não sei se fui claro, mais ainda hoje será apresentado um novo post que tenta apresentar este pensamento em um exemplo prático, o que é semrpe mais ilustrativo.

    Grande Abraço e obrigado pela presença no Blog!

  • Fábio Lindoso e Lima

    Ney,

    Em primeiro lugar, gostaria de parabenizá-lo pelo brilhantismo desta contribuição, bem como das feitas anteriormente ao blog.

    Na verdade, penso que a grande mudança paradigmática nas relações privadas não ocorreu com a Constituição Cidadã de 88 e sim com o Código Civil de 2002.

    É bem verdade, no entanto, que o novel diploma civil encontrou substrato legal na magna carta, de maneira que sem esta seria impossível realizar a transição do cc de 16, o qual tinha como centro o patrimônio e não a pessoa humana, para o novo diploma civilista, o qual toma o homem como ponto de de partida para, posteriormente, tutelar os demais bens jurídicos.

    É claro que isto só foi possível graças ao arcabouço principiológico da CF/88, a qual traz em seu bojo ideais como a dignidade da pessoa humana e a solidariedade social.

    No tocante ao debate suscitado (direito versus economia), penso que é estritamente necessária a criação e a interpretação das leis sob a ótica da ciência econômica, porque as duas ciências tem um ponto de convergência: o desenvolvimento econômico do cidadão, para proporcionar a este condições de viver uma vida digna.

  • Prezado Ney,

    Não sei se você recorda das minhas críticas em seu post anterior.
    Fiquei com a sensação constante (que ainda hoje me incomoda) de estar subestimando seus argumentos. Se passei essa idéia, deixo minhas escusas publicamente.
    Na verdade, a intenção foi realmente fomentar a discussão, pois, quando li a notícia do STJ (a mesma que motivou o seu post, sobre furto de celular), fiquei em um dilema: de um lado, o sistema protecionista ao consumidor, que, acredito que você partilhe da mesma opinião, em nosso país, ainda tem grande relevância isonômica. Por outro lado, o fato de o Direito não poder dar as costas à realidade, sobretudo a econômica.
    Não sei também se você lembra, mas fomos colegas na pós em processo civil, coordenada pelo Fredie.
    Forte abraço, parabéns pelos posts, e renovo minhas justificativas.

  • Saulo Michiles

    Creio que a crítica da falta de visão antropocêntrica da Economia, ou de uma certa “frieza” dessa ciência, como vejo alguns juristas criticarem a união entre Direito & Economia, tem certo fundamento, dada a utilização de ferramentais matemático-estatísticos para analisar questões que muitas vezes envolvem valores não captados por esses instrumentos, como a ética, o valor da vida quando se fala de aborto ou, até mesmo, clonagem humana. A meu ver, o Direito como ciência social aplicada só sobrevive e vai sobreviver por ter um certo monopólio da ética e por conseguir tratar, embora as vezes não tão bem, de valores subjetivos e transculturais como boa-fé, dignidade da pessoa humana, função social, etc.
    No entanto, não é possível que a sociedade, muito menos o Direito, ignorem a visão econômica de que, muitas vezes, o homem age tão somente como um ser racional, desmotivado por sentimentos mais profundos. É o caso do “Seu João”, abordado no post, a sua vida é entremeada por incentivos econômicos (no sentido mais lato da palavra) e ele age de acordo com esses incentivos, perpassando, muitas vezes, as regras do direito.
    Prezado Dr. Ney, me permita alongar um pouco mais o comentário para defender a mesma visão simbiótica entra as duas ciências, já defendida por você em outro post.
    A convergência natural e histórica entre as duas disciplinas fica clara ao se comparar uma definição básica, mas abrangente, do que é Economia, com o que se costuma estudar nas faculdades de Direito na disciplina chamada Teoria Geral do Processo. Para Richard A. Posner, “[...] a economia é a ciência da escolha racional em um mundo (nosso mundo) onde os recursos são limitados em relação às necessidades humanas.”
    No primeiro capítulo de sua obra “Teoria Geral do Processo”, J. E. Carreira Alvim analisa conceitos de necessidade, bem, utilidade, interesse, conflito de interesses, pretensão, resistência e lide para conceituar o processo: “O processo é o instrumento de que se serve o Estado para, no exercício da função jurisdicional, resolver os conflitos de interesses, solucionando-os [...]”.
    Ou seja, a Economia se preocupa em estudar como se comporta um ser humano, racional, ao se deparar com suas necessidades pessoais, em face da escassez de recursos (que as satisfazem) e em face das necessidades de outro ser (o que pode gerar os conflitos de interesses). Enquanto que o Direito, através do processo, se preocupa em resolver os conflitos de interesses surgidos entre seres humanos, decorrentes de suas infinitas necessidades em torno de recursos escassos. Donde se conclui, do próprio enfoque das duas disciplinas, que a não união de esforços de profissionais das duas áreas, seria, para dizer o mínimo, desperdício intelectual.

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