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Direito & Economia, e o Prêmio dos Empregados

O bLex em vários posts tem enfrentando a importante ligação entre o direito e economia, inclusive eu próprio já analisei tal questão, quando do comentário da decisão do STJ a respeito de furto ou perda de aparelhos celulares que estivessem no período de fidelidade.

Volto ao tema, para tentar enfrentá-lo de maneira ainda mais direita, reforçando o entendimento já esposado, não apenas no bLex, mas por vários autores, de que o direito não pode ser interpretado à revelia de regras econômicas, sob pena de se afastar da realidade e pior, alcançar fim completamente diverso daquele pretendido pelo legislador ou pelo intérprete da norma, por serem indissociáveis.

Tal raciocínio parte de um ponto um tanto quanto simplório: a economia se encontra no dia-a-dia de toda cidadão, tanto em suas finanças domésticas, quanto em suas relações com o mercado, com seus patrões, empregados etc., sendo certo que, no mundo moderno, o movimento da macroeconomia gera enormes conseqüências na vida do “Seu João”.

Reconhecendo-se a importância da economia na vida das pessoas, é certo que tal ciência há de ser analisada à luz do direito, visto se tratar de uma ciência que regula todo tipo de relação humana, dentre as quais, a do homem consumidor, fornecedor, patrão, empregado, locador, locatário etc.

Sem dúvida, alterações na realidade econômica exigem o adequado acompanhamento do direito, com o fito de que se mantenha apropriado à necessidade dos cidadãos, da mesma forma que alterações no direito acabam gerando conseqüências na realidade econômica, havendo clara relação de causa e efeito entre ambas.

A grande busca há de ser o alcance de uma relação simbiótica, em função da interdependência destas duas ciências, onde os interesses opostos caminhem em prol de um objetivo comum.

Destaco a importância deste raciocínio em dois ramos do direito em especial, por seu caráter ilustrativo, o direito do trabalho e direito das relações de consumo (sendo discussão estéril, neste momento, se as relações de consumo configuram ramo próprio de direito, idéia por mim comungada), em função de regularem relações entre desiguais, ambas baseadas na vulnerabilidade e hipossuficiência de um dos pólos (empregados e consumidor) em contraponto ao capital (empregador e fornecedor).

Estes dois ramos do direito possuem tratamento protetivo aos pólos vulneráveis da relação, apresentando arcabouço jurídico diverso do direito privado, que regula relação entre os pares, com regras de direito material e processual próprias.

Destaco de antemão, embora já reste claro acima, que nem de longe discuto a real necessidade de um regramento próprio a estas espécies de relação, sob pena de que haja verdadeiro esmagamento do pólo debilitado da relação.

O que defendo é que tal tratamento seja legislado e aplicado à luz da visão de que direito e economia devem caminhar conjuntamente, sob pena de que seu real escopo não seja alcançado.

Digo isso, porque o legislador (em certas situações) e o aplicador do direito (quase sempre) vislumbram estes ramos do direito de maneira alijada da economia, crendo que a defesa dos vulneráveis deve se dar através da punição do outro pólo, de maneira tal que acaba desestabilizando o sistema como um todo.

A grande premissa que deve nortear tanto o legislador quanto o intérprete destes ramos do direito é o de que o fim buscado há de ser o equilíbrio da relação, sendo o tratamento protecionista o instrumento de tal fim.

Contudo, é comum a equivocada idéia de que o objetivo da CLT ou do CDC é a proteção do trabalhador ou do consumidor, o que faz com que a aplicação da norma protecionista perca qualquer parâmetro de razoabilidade, pois passa a ser um fim em si próprio e não um instrumento de pacificação, através do reequilíbrio da relação.

Essa visão distorcida gera a perda da medida na aplicação da norma protecionista, que muitas vezes se atem a inverter o pólo prejudicado da relação, determinando duas conseqüências, ambas prejudiciais aos vulneráveis: a primeira, já enfrentada em neste primeiro e neste outro post do Daniel, de que cada vez é mais difícil explorar atividade econômica neste país; e a segunda já tratada por mim em post anterior, de que os ônus desproporcionais impostos aos empregadores e fornecedores, inevitavelmente serão devolvidos aos empregados e consumidores, que finalisticamente responderão por tal ônus.(regra clara de economia – repartição do prejuízo).

No âmbito das relações de consumo já houve post próprio, cabendo aqui interessante exemplo vivenciado em meu escritório quanto ao direito do trabalho.

Fui procurado por um cliente que teve contra si lavrado Auto de Infração, pelo fato de haver deixado de computar, para o cálculo 13º salário, a parcela paga a título de prêmio, distribuída aos empregados que fossem os melhores vendedores, de cada área da empresa, por meio de cartões de premiações.

O referido auto de infração entendeu que tal bonificação possuía natureza salarial, pois comporia o conglomerado de vantagens pagas em pecúnia ou em utilidades, que compõem o salário do obreiro, sendo habitual pelo fato da bonificação haver sido paga durante 2 anos.

Sinceramente, entendo que o referido entendimento é por demais irrazoável visto que o pagamento dos prêmios tinha como objetivo o incentivo e motivação de seus colaboradores, materializando-se em um ato unilateral de manifestação de vontade, na modalidade de promessa. É certo que “habitualidade” para norma, como elemento de transformação da bonificação em verba salarial, não pode ser considerada apenas em uma mão, ou seja, apenas quanto à repetição na oferta do prêmio pelo empregador, mas também quanto à repetição em seu gozo por parte de um obreiro, para que aí sim, definidos os dois pólos da relação bilateral, a verba possa ter natureza salarial.

Para minha surpresa, o raciocínio aplicado pelo MPT encontra guarida em boa parte da doutrina a respeito da matéria, que a meu ver aplica exatamente o raciocínio aqui atacado, de que o trabalhador deve ser defendido a todo custo, sem qualquer análise razoável no caso concreto.

Verdadeiro oásis se mostrou o entendimento do professor Aldemiro Dantas que entende que o prêmio pago em virtude de um mérito pessoal do empregado não configura verba salarial. O ilustre mestre dá como exemplo a loja que prometer pagar a quantia de R$ 100,00 ao empregado que, no final do mês, for melhor vendedor, donde o empregado que vender mais do que os outros, portanto, receberá a quantia prometida como paga de um mérito seu, individual, e por isso estará recebendo um prêmio.

Digo que a aplicação de norma protecionista foi irrazoável por motivo óbvio: a política de prêmios foi sepultada, visto que ainda que a empresa reverta o auto não mais distribuirá prêmios aos seus empregados, com o fito de evitar tamanha dor de cabeça, ou seja, finalisticamente o maiores prejudicados acabaram sendo os empregados, a quem o MPT acreditava estar defendendo.


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